"A ideia do meu título vem de uma história que não tenho o conhecimento de ser verídica ou não, mas parece-me plausível, que conta que o compositor Erik Satie escrevia de uma forma um tanto revolucionária para o seu meio e comunidade artística, não encaixava num paradigma, e então decidiu entrar em ruptura com ele.

Quando criticado pelo facto das suas obras não obedecer a estruturas musicais convencionais, chamadas as “formas”, Satie, homem humorado e dotado de um espírito surrealista respondeu às críticas escrevendo uma obra composta por três peças, às quais intitulou como “ Trois Morceaux en Forme de Poire “. Esta história ilustra perfeitamente a relação que um artista pode ter com um grupo apoiante de um paradigma que o rejeita, o músico usa uma retórica que se apodera das bases de um sistema, mas aproveita também para as subverter criando uma fusão entre estas e as próprias características do paradigma que o artista quer ver como reconhecido. Satie era acusado de não escrever com forma, porque as suas músicas não condiziam com uma forma já inventada, e então, inventou uma forma, que condizia perfeitamente com a sua música. Gosto de levantar aqui um paralelismo entre a música/arte e as teorias de Khun acerca da evolução da ciência, em casos de inovação incomensurável com o paradigma em vigor, a única solução possível para o funcionamento da inovação é uma mudança total de paradigma. Chamo a atenção para a comparação estar a ser feita entre os sistemas paradigmáticos quer da arte quer da ciência, os quais se apoiam em tradições, em vontades e valores subjectivos, e em ligações também pessoais e afectivas com certas correntes, grupos e culturas; esta comparação não diz respeito às semelhanças entre a música/arte e a ciência em si. Ao longo da história, quer da arte, quer da ciência, existiu a tendência de reprovar teorias e propostas novas em base de verdades absolutas e dogmas; mas estes dogmas são facilmente derrubados quando estas novas propostas mostram resultados práticos, quando “funcionam” e, sobretudo, quando são aceites numa comunidade; é a partir destes resultados que as mudanças estruturais de todo um sistema de crenças e pressupostos ocorrem. É óbvio que estes resultados mostram-se muito mais facilmente na música e na arte, visto que a natureza destas actividades é muito mais apelativa às pessoas do que teorias científicas, embora recentemente, se tenha desenvolvido um interesse por uma aproximação não técnica às teorias científicas do séc. XX e XXI, interesse verificado nos inúmeros vídeos e documentários feitos de maneira a explicar de uma forma simples (embora superficial) acerca de teorias muito complexas. Neste processo de contradição de paradigmas usando novas propostas, nos quais não encaixam, através de trabalhos que até podem ir contra a própria intuição e valores estéticos do artista, podem-se descobrir novas formas de ver a realidade e interpretar a realidade no seu todo."

Excerto de

Galeria em forma de esfera, de Henrique Apolinário, aluno do 11º B

apresentado a 9 Junho, no CMI da ESSL, no âmbito do Projeto Curricular de Turma 2010-2011: 'A verdade na arte'

 


 
 
 

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