À entrada, o senhor Mário, encarregado da obra, recebe-nos com simpatia. Aqui, nesta entrada, é ele o diretor. Depois de nos conseguirmos esgueirar entre um montão de terra com raízes de árvores derrubadas e o velho edifício das oficinas, sob a ameaça da enorme pá da retroescavadora, conseguimos alcançar a entrada. Uma brigada de assistentes operacionais carrega estantes, maquinetas, coisas avulsas que nem nós sabemos para que serviam. Mergulhamos nas oficinas de mecânica.
Cenário de guerra. Portas arrombadas, salas vazias, vidros partidos, equipamento em cima das mesas e bancadas, máquinas aguardando a sua vez. A secretária da D. Arminda foi substituída por um montão de destroços. Mas há por aqui professores, um desaparafusa uma tomada, outro arruma material numa caixa, dois transportam equipamento para os carros. A máscara e a viseira sãos sinais visíveis da época Covid-19. No quadro de uma das salas, os últimos apontamentos, o indecifrável esquema de uma aula dada, ou que ficou por dar, não sabemos. A máquina que devia executar as ordens deste quadro talvez só já venha a funcionar nas novas oficinas. Do lado das oficinas de Arte e Eletrónica, o panorama é menos devastador, mas adivinha-se o que vai acontecer. Uma professora pede informações ao telemóvel, outro arruma equipamento numa caixa. Pelo chão, jazem projetores, quadros interativos, material “das artes”. A secretária da D. Catarina ainda lá está, mas a inquilina deve andar por esses corredores a transportar material.
A visita de despedida está a chegar ao fim. Um último olhar. Não queríamos terminar com nostalgias fáceis. Sabemos que este edifício há muito devia pertencer ao passado. Mas não podemos deixar de nos lembrar dos milhares de aulas que foram dadas nestas salas, das centenas de funcionários dedicados que transitaram por estes corredores, da quantidade de saber transmitido por docentes empenhados, das vivências pedagógicas e humanas experimentadas por alunos desejosos de aprender. Afinal, foi aqui que nasceu a Serafim Leite moderna, com o nome de Escola Industrial, num tempo em que os alunos desciam por veredas da encosta, para virem descobrir o seu futuro.
Dentro de dias, estas paredes virão abaixo. O sr. Mário está a ficar impaciente. A obra está atrasada. Esta obra esteve sempre atrasada, mas agora está menos. Os ferros do futuro já estão a ficar entrançados sobre as bancadas. A enorme pá da escavadora espera pela sua hora.
Talvez ainda lá voltemos, antes que caia o pano da destruição final…
Celestino Pinheiro
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