O antigo Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, Laborinho Lúcio, regressou a S. João da Madeira na noite da passada sexta-feira para uma conferência sobre os malefícios do tabaco que, rapidamente, caminhou para a definição da arte, o seu objetivo e lugar na educação das crianças. O magistrado foi convidado pela organização do festival de teatro a conduzir uma sessão em torno do tema "criatividade", em consonância com o recentemente afirmado paradigma da cidade e as movimentações em torno do mesmo.
Laborinho Lúcio partiu da estrutura e conceito do monólogo "Os Malefícios do Tabaco", do escritor russo Anton Tchekov, e dissertou sobre o papel da arte na formação do indivíduo.
Encarnou o homem frustrado e medroso idealizado por Tchekov, que dá conferências beneficentes às ordens da mulher mas, assim que ela vira as costas, desabafa todas as suas mágoas e pensamentos. No caso, sobre a arte. Como ela "não existe para, mas esgota-se no absoluto da sua antologia"; como, citando Sophia de Mello Breyner, "não explica, implica"; como "transcende o mundo imediato para os limites do sublime"; como, enfim, faz todas as perguntas que a ciência não responde.
"Temo que a educação tenha caminhado para longe da importância da arte", confessou. "A rigidez das normas leva vantagem sobre a essência das coisas", quando "a formação crítica do sujeito deve ser a prioridade da escola".
Laborinho Lúcio considera que a escola deve ensinar a pensar, escolher e fazer, formando para a dissidência, para uma espécie de "rebeldia competente", em que "dizer não", seja ao que for, é feito em consciência e implica assumir as consequências inerentes.
Neste contexto, a criatividade "é uma atitude" que deve estar no topo das preocupações de uma escola. "Há o risco de transformar a criatividade num objeto que está fora de nós quando está dentro do próprio pensamento", alertou.
Defensor da escola pública, Laborinho Lúcio lamentou, contudo, que a escola se assemelhe a um hospital ortopédico que trata com o mesmo gesso fraturas diferentes. Pediu aos professores presentes que ocupem o espaço público e deixem-se condicionar por ele e sugeriu a reserva do primeiro mês de aulas para conhecer os alunos, num exercício de identificação de lacunas e competências do qual parta, enfim, a educação do sujeito.
Sobre o tabaco e os seus malefícios, disse-se, afinal, muito pouco numa sessão que se prolongou até perto da meia noite. 179 pessoas assistiram à palestra do juiz jubilado nos paços da cultura.
in jornal Labor