O convite rezava assim: Entre na aventura da construção de um roteiro criativo… E o público entrou. Noite de 2 de março, auditório dos Paços da Cultura à cunha, palco enfeitado com um escadote, um guarda-chuva, um bengaleiro ajoujado de chapéus, uma mesa cheia de tralha a sugerir saltimbancos.

À esquerda um escaparate com o menu da noite: um ponto de interrogação assim: “?”. Objetos todos indispensáveis ao roteiro, viagem feita de imaginação, conduzida pelo professor Amílcar Martins, homem do teatro e de muitas outras artes e por Teresa Alexandrino, artista plástica, mulher também de muitas artes e navegações.

Equipa-IMG 9066A dar início a mais esta viagem de Palcos e Cenas, uma espécie de aperitivo para o Festival de teatro que há de correr lá para abril, a professora Elza Paiva, do Espaço Aberto, saudou os aventureiros presentes. Depois, a diretora da Serafim Leite, professora Irene Guimarães, lembrou que os festivais de teatro já não cabiam nos dedos de uma mão e saudou as artífices do Espaço Aberto, a atuais (Elza Paiva, Cristina Reis e Manuela Balseiro), as pioneiras, e as que, mesmo já não estando na Escola, continuam a dar o seu contributo ao projeto. “Mas vamos trabalhar, porque estamos numa oficina! O palco e a nossa atenção são vossos.”

O Teatro e a voz

Entra Amílcar Martins, com o seu chapéu arejado, a cantar uma ária italiana e a questionar o público“Poderá o teatro ser a via de acesso à coragem?” A coragem do teatro cria-se desde a infância, do jogar ao “faz-de-conta”, a forma primeira de fazer teatro. Curiosamente, essa é também a idade dos porquês. Porquê? Onde? Quem? O faz-de-conta e o questionar são elementos simultâneos da infância, ambos primordiais na construção do ser humano. O Teatro é o corpo e a voz, é a coragem de se assumir como ser individual. Mas vamos trabalhar, porque foi para isso que me convidaram.

Primeiro exercício. Uma folha de papel distribuída pelo público, para dobrar em quatro. Rasga-se no ângulo da dobra uma secção de 90 graus. Resultado: ao desdobrar-se a folha, surge um buraco, o buraco por onde comunicam os dois lados do teatro: o palco e a audiência, o palco e o público. O teatro é isso: palco e público. A envolvê-los, as emoções. Por isso, o segundo trabalho da noite foi um exercício de palavras e gestos, sobre as emoções. Digam todos “peito-estala-bate / peito, bate, estala / bate, estala, peito”. E os navegantes a bater com a mão peito, as estalar os dedos, a bater as palmas, tudo gestos da emoção, gestos do teatro, gestos da vida: …peito, bate, estala…

O Teatro e a imaginação. Os artenautas.

Terceiro trabalho da noite: a interpretação (ou a leitura?) dos artenautas de Teresa Alexandrino, desenhos, máscaras, chapéus mágicos, inspirados em viagens que entrecruzam ideias: “leitura, canto, declamação, teatro - a arte do momento”. Artenautas africanos plenos de sugestão, projetando conceitos que se soltam das máscaras-cabeças: criatividade, aprender, ensinar, comunicar, interpessoal. A viagem termina nos astros e no infinito, porque, se há coisas infinitas, a imaginação é a primeira delas. A Ana Sofia, encantada com o chapéu mágico de bruxa que ela já tinha visto algures, não conteve a reação: eu conheço esse chapéu! Afinal, como diria Amílcar Martins, o chapéu é um adereço com grande força plástica. Quando colocamos um chapéu, é como se nos transformássemos em contadores de histórias. Calha bem, estamos na terra dos chapéus!

O público, que já tinha dado alguma colaboração nos exercícios anteriores, teve ainda que responder ao derradeiro apelo dos animadores. Afinal isto não é uma oficina? Se é, toca a trabalhar! Vamos! Para o palco, já!” Umas boas dezenas de corajosos abandonaram os assentos moles do auditório, para pisarem as tábuas duras do palco; primeiro, inspirados no chi do teatro oriental, braços ao alto e ao largo a congregar energias. Depois, exercícios de voz – o rato roeu a rolha da garrafa do rei da Rússia. Rápido! Mais rápido! Agora devagar. Agora com as entoações sugeridas pela pontuação do menu-escaparate. O rato roeu a rolha do rei da Rússia! O rato roeu a rolha da garrafa do rei da Rússia? O rato roeu a rolha da garrafa do rei da Rússia… Salada saladinha muito bem temperadinha. Azeite, vinagre, sal e pimenta. E o público a esfalfar-se. E os do palco a discutirem animadamente entre si: má mé mi mó mu?... má mé mi mó mu!.... má mé mi mó mu…

"Um dia, um guarda-chuva"

Equilibrista-IMG 9033O penúltimo exercício proposto às gentes do palco foi a recriação da história "Um dia, um guarda-chuva", escrita por Davide Cali e ilustrada por Valerio Vidali, grande prémio de ilustração da Ilustrarte 2012. Era preciso um autocarro: os oficinantes fizeram-no, em fila, de carreirinha. Era preciso um guarda-chuva, esse estava pendurado no escadote. Foi preciso um condutor, arranjou-se logo um. O larápio também não foi difícil de encontrar. Depois, a viagem prosseguiu, umas vezes tranquila, outras aos solavancos, enquanto o guarda-chuva se transformava em taco de golfe, em auxiliar do equilibrista, em arma de soldado, em barco de gatos apetecendo peixes, em peça de antiquário. E foi no antiquário que alguém o comprou. E o novo dono do guarda-chuva apanhou o autocarro e desapareceu, para acabar a história, porque convém que as histórias tenham um fim, apesar de serem filhas da imaginação.

O que é que a coragem tem lá dentro?

Último exercício. Se o tema da oficina é o teatro e a coragem, então talvez valha a pena fazer uma pergunta: O que é que a coragem tem lá dentro? O que é que há dentro da coragem? E os calcantes do palco a puxarem pelas meninges. Lá dentro, a coragem tem vontade, tem o canto, tem o mistério, o sucesso, as palavras, a força, a liberdade, a alegria, a tristeza, a originalidade, a vontade de vencer o medo, a entrega, a realização dos sonhos, a criatividade, o amor, a ausência de limites… Olhem o público de frente! Convençam o público! O que é que a coragem tem lá dentro? A vida, o movimento, o infinito, a nostalgia, a vida, a vida toda. Parabéns pelas mensagens tão fortes. Este é o caminho que o teatro deve trilhar, para que cada vez se torne mais conhecido. Dentro de teatro estamos todos nós!

Mas foi também necessário sair, porque a noite já ia tarda. Coube à professora Elza, em nome do Espaço Aberto, confessar aquilo que todos sentiam: obrigado por este momento tão rico. Marcamos encontro para Abril.

Salada saladinha muito bem temperadinha! Palco, cenas e processo criativo - a espontaneidade, a situação e a arte do momento. Em Abril haverá mais!

Fotos do artigo: Ricardo Ferreira - 11º I

Fotos do slideshow: Ana Rita - 11º I

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